terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Crise de identidade

Esses dias eu estava assistindo o show do Marcelo D2 no Planeta Atlântida e pra variar ele estava defendendo a maconha e aquela coisa toda. E foi aí que me ocorreu que hoje em dia os únicos que questionam a sociedade, que polemizam, que chocam, que demonstram alguma revolta são os rappers, e não mais o rock n’roll.

Quem conhece o mínimo de rock sabe que até uns 15 anos atrás rockeiros eram vistos como rebeldes, arruaceiros, um perigo a sociedade e etc. E movimentos como o punk lá dos anos 70 confirmavam isso. Moicanos, cabelos compridos, tatuagens, piercings, roupas rasgadas eram considerados agressivos e uma forma de se opor ao status quo. As letras, muitas vezes raivosas, abarrotadas de palavrões e críticas a sociedade, e não só no punk, mas no metal, rock progressivo, grunge, post-punk ,hardcore e até no sempre fanfarrão hard rock apareciam canções cheias de agonia, amargura e descontentamento com o andamento das coisas.

E hoje, em 2012? tudo o que eu vejo são letras de amor, cabelos bem cortados e roupas comportadas, enquanto os outrora “símbolos da resistência” estão na cabeça do Neymar, em roupas de grife e no corpo de patricinhas. A rebeldia virou moda e os rebeldes entraram na linha.
É claro que existem bandas no underground que ainda mantêm o espírito contestador de antes, mas eu me refiro especificamente ao mainstream. Se a gente parar pra pensar que um dia bandas como Ramones, Metallica, Black Sabbath e The Clash já estiveram no primeiro lugar das rádios e comparar com o que toca hoje, fica claro o que eu quero dizer. E eu não estou nem me referindo a qualidade das músicas em si, falo apenas da temática. Cadê as letras profundas que nos deixam pensando horas depois de a música acabar, não em um amor perdido, mas na própria vida? cadê o espírito questionador, a rebeldia do rock? parece que ficou de herança pro rap, que é o único estilo que ainda debate as mazelas da sociedade e não apenas as do coração. E mesmo quando se trata do coração, é como se a única agonia possível fosse o amor. O ser humano é muito mais complexo que isso, se preocupa com o futuro, com dinheiro, com a existência de Deus, com a morte, com as pressões do dia-a-dia entre muitas outras coisas que eu poderia passar dias citando, mas parece que os compositores atuais se esqueceram disso. E eu nem vou falar dos solos de guitarra desaparecidos, a impressão que eu tenho é que a geração atual desistiu de estudar música e ficou só no básico, mas não foi o básico do punk que tinha a ideia do faça você mesmo por trás, é um básico de “tenho preguiça de estudar” mesmo.

Já o rap nasceu como forma de contestação do preconceito contra os negros e pra dar voz a uma sociedade oprimida, e se manteve desse jeito. Concordando ou não com suas opiniões é preciso admitir que pelo menos eles têm uma opinião e muitos sabem expo-la magistralmente. É óbvio que existem aqueles que só falam de carro de mulher, mas eles convivem com o rap engajado, assim como o rock está cheio de bandas que só falavam de drogas e mulher, mas nem por isso deixaram de existir bandas politizadas.

O pop sempre foi fútil (o que não quer dizer que seja ruim) e continua sendo. O soul continua falando, bem, da alma. E o rock se perdeu no meio do caminho, espero que essa crise de identidade passe logo.